sábado, março 16, 2019

Silêncio e Empreendedorismo – Julio Rezende


Era 15 de março de 2019. Estava no hall do Kala Boutique Hotel em Punta Del Este, um pequeno hotel. Era antes de 8 horas e aguardava o início do café da manhã. Havia um grande silêncio, pois fui a primeira pessoa a chegar ao café. Neste pequeno momento, ocorreu-me uma COEX, termo esse criado pelo psiquiatra Stanislav Grof, para descrever uma conexão com uma memória antiga. 
Recordei-me de todo um conjunto de experiências que tive desde que comecei a estudar a psicologia transpessoal em 1995 e o contato que tive com a psicologia tibetano budista através do psicólogo Léo Matos.  Léo Matos, de modo pioneiro, foi um dos primeiros psicólogos no mundo a perceberem como o Budismo Tibetano apresentava técnicas mentais avançadas, no sentido de moldar fisiologicamente o nosso cérebro, conceito esse que foi explorado pela neurociência como neuroplasticidade. 
Essa memória antiga que tive, que na verdade era um conjunto de experiências, remonta à experiência de estar em mosteiros budistas nos anos de 2003 e 2008 em Dharamsala, nas montanhas do Himalaia indiano, e de perceber o mesmo silêncio nas salas e corredores daqueles lugares.
Contudo, não é necessário ir a um lugar distante para essa experiência meditativa, de contato com o silêncio. Em um tempo de chuva, nossa atenção pode se voltar à atenção com os pingos de chuva que escorrem pelas telhas e pingam aqui e ali na janela de nossa casa. Em qualquer lugar o silêncio deve ser degustado em um tempo de cada vez maior número de estímulos que vêm em grande modo dos nossos próprios smartphones e os constantes alertas de uma grande variedade de conteúdos com ou sem importância. Chamaria esse momento de overinformation, ou sobreinformação, condição essa na qual consumimos mais informação que o necessário, e não necessariamente conteúdos positivos, que se transformarão em conhecimento, mas conteúdos que só nos têm feito perder o nosso tempo e contribuído para a perda do sentido humano.
Percebo o quanto nos falta o silêncio, e digo isso não de modo genérico, mas algo que afeta a minha própria pessoa. Como me faz falta esses momentos de silêncio que parece ter-me afastado. Tudo isso me convida a repensar a própria vida e meus empreendimentos como o Instituto Boa Sorte, em Caiçara do Rio do Vento, um local para promover experiências de convidar as pessoas a estarem mais próximas de suas motivações pessoais.
Escrevo este texto na oportunidade que o mundo lembra os 60 anos (10 de marco de 1959) que o Dalai Lama vive no exílio, quando o exército chinês invadiu a cidade de Lhasa, capital do Tibete, empreendendo um processo de anexação do país ao seu território e de iniciar um processo de perseguição  do povo tibetano até os dias atuais.
O Dalai Lama conseguiu escapar do domínio chinês e após um longo trajeto se refugiou na cidade de Dharamsala, no estado de Himachal Pradesh, vizinho ao estado da Caxemira. À Medida que o Dalai Lama foi morar na Índia, algo inesperado aconteceu: o Budismo se espalhou pelo mundo, em um processo de universalização e de chegada desse conhecimento ao exterior.
Sempre é tempo de praticar meditações voltadas ao silêncio; de explorar a expansão da consciência, temas esses que podem estar muito mais próximos do silêncio, do que a velocidade das ideias. 
Meditações inspiradas no Budismo Tibetano, nos inspiram a refletirmos sobre o que faz sentido para as nossas vidas. Esses momentos de silêncio são oportunidades de pensar nos nossos projetos pessoais e paradoxalmente isso possui uma profunda associação com o empreendedorismo.
Uma das maiores empresas do mundo, a Apple, teve como seus pilares experiências meditativas empreendidas pelo seu líder Steve Jobs. É difícil imaginar a nossa vida sem o impacto de grandes empreendimentos e variadas descobertas científicas e grandes inovações que surgiram a partir da experiência do silêncio de seus empreendedores.
            Desse modo, em uma época na qual as metodologias de coaching se popularizam como uma forma de orientação a uma grande variedade de profissionais, talvez ainda mais importante reaprendermos a cultivar o silêncio. Se você quer empreender, você precisa silenciar-se. 

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